quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Os mestres




Sri Dakshinamurti



Sri Shankaracarya





Sri Swami Tapovan




Sri Swami Chinmayananda

Sri Swami Tarananda Giri e Gloria


Sri Swami Dayananda e Gloria




Ter um mestre faz diferença na vida de uma pessoa. O mestre é chamado de guru - gu significa andhakara, escuridão, ignorância; ru significa tan-nivartakah, aquele que elimina a escuridão de sua mente.

O problema de sofrimento se dá devido a ignorância de si mesmo, de sua natureza real. O mestre é a pessoa que, tendo resolvido seu problema de carência e sofrimento, pode ajudar outro a resolver seu próprio problema. Alguém que já está livre, nada tem mais a ganhar, e, por isso, pode ajudar outros. E ajuda através de ensinamento, de transmissão do conhecimento do Eu livre.

Conhecimento é a maior bênção na vida de uma pessoa. Qualquer que seja o conhecimento, ele revela algo novo, até então desconhecido e que ao ser conhecido entra em nossa vida. Quando o objeto do conhecimento é si mesmo, o Eu, e ainda mais um Eu que já é livre, a bênção é total. Faz toda a diferença para a pessoa, em sua vida.

Além disso, ter um mestre é fazer parte de uma família de conhecimento, é pertencer a uma linhagem de luz, de conhecimento. Todas as pessoas que estão antes de nós se tornam o suporte, a inspiração, para nossa vida.

Ter um mestre é ter luz, clareza, na vida; ao mesmo tempo é saber que a grandeza, que fez o mestre ser quem ele/ela é, é conhecimento e esse conhecimento é o presente que recebemos. Como uma lâmpada de fogo que ilumina completamente outra e faz dela uma fonte completa de luz. A bênção é total. A bênção é de conhecimento, adquirida pelo mestre.

A FELICIDADE ESTÁ CENTRADA NO EU

A FELICIDADE ESTÁ CENTRADA NO EU


Sri Swami Dayananda




Swami Dayanandaji e Swami Chinmayananda nos anos 70s



É até engraçado dizer que devemos nos libertar de nós mesmos.  A gente sempre pensa que estamos limitados por uma série de fatores externos; e basicamente nos sentimos frustrados. Essa é uma descoberta que nos torna mais humildes. Nós não somos capazes de nos aprovarmos tal como somos.  A tentativa constante é então de nos tornarmos diferentes do que somos. Nesse processo criamos mais problemas para nós mesmos e naturalmente para os outros ao nosso redor.


Liberdade significa ser livre de culpa e de dor

Tem uma frase na Taittirīryopaniṣad, kimahaṃ sādhu nākaravaṃ kimahaṃ pāpaṃ akaravam iti (2:9), “Por que eu não fiz a coisa certa? Por que eu agi errado?” Mesmo que você não repare ou não leve muito à sério, sempre haverá alguém que irá apontar suas faltas e omissões. Suas próprias faltas e omissões o fazem sentir culpado, enquanto as faltas e omissões dos outros mais próximos o magoam. ‘Por que ele ou ela não fez isso por mim, ou por que fez isso comigo?’

Você é o sujeito e você também é o objeto. Como sujeito da ação você é culpado e como objeto da ação você é magoado. Portanto, para a pessoa autoconsciente a culpa e a mágoa naturalmente agem contra ela como pessoa. A Gītā diz ātmaiva ripurātmanaḥ (6:5), “O indivíduo é seu próprio inimigo”. A pessoa se torna sua própria inimiga porque ela não se aceita. E pensamento positivo não ajuda em nada aqui.


Tudo é um privilégio se existe auto aceitação

Você tem de se ver como aceitável por si próprio. Nesse caso, você é uma pessoa livre. Sua mente é um privilégio, porque mesmo sem pensar você fica satisfeito com quem você é.  O pensar é um privilégio. O desejar é um privilégio. Sem as lembranças e reminiscências você é feliz sendo você mesmo. Sem desejar nada você é feliz. Você é livre para ter desejos. Na realização de si mesmo existe satisfação. O seu corpo físico é um privilégio. Suas limitações na verdade não contam se você é uma pessoa realizada. Isso é liberdade. O indivíduo é livre o suficiente para ter um corpo limitado, uma mente limitada, ou os sentidos limitados. Tudo que é externo é lucro para você. Essa liberdade não é relativa. A liberdade relativa é sempre variável porque você é livre apenas por um momento—quando você se esquece do fato que você não se considera aceitável. Portanto, liberdade relativa resulta em felicidade relativa.
           

Felicidade não é um objeto ou um atributo

A felicidade não pode ser um objeto em particular. Se assim o fosse, nós a podíamos reter. Felicidade não é nem o objeto nem o atributo do objeto. Uma folha é um objeto. Quando você diz ‘folha verde’, o verde é um atributo da folha. De forma similar, não existe um objeto chamado ‘o objeto feliz’ que tem por atributo específico a felicidade, como a cor verde da folha.  Felicidade não é um atributo que é visível e nem é um substantivo. Não existe um lugar em particular que possa fazer você feliz ou infeliz. Aliás, qualquer lugar pode fazer você feliz ou infeliz. Também não existe uma determinada hora que você possa chamar de ‘a hora feliz’. Você não pode determinar que todo dia às cinco da tarde você fique feliz. Isso significaria que pelo resto do dia você não estaria feliz. Isso não é verdade. Igualmente você não pode dizer que os relacionamentos são a felicidade. Todas as relações têm seus problemas. Tudo o que temos neste mundo—o tempo, os lugares, os objetos, os atributos dos objetos, e os relacionamentos—não podem ser chamados de felicidade.


Você não precisa satisfazer um desejo para ser feliz

Apesar disso, ocasionalmente você descobre que você é feliz. Mas já que ocasionalmente você é feliz, você não entende algo claramente: a felicidade não é devido a algo, nem mesmo a um esforço para alcançar algo; ela acontece a sua revelia. Se você fica feliz apesar de todos os desejos que não foram realizados, isso não deveria ser um indicador que você não deseja satisfazer seus desejos para ser ficar feliz? Se você precisa satisfazer todo e cada desejo para ser feliz, assim você não pode ter um momento de alegria em sua vida.

Os desejos a serem satisfeitos são inúmeros. E os desejos em curso também ficam insatisfeitos. Então, afinal quando você vai ser mesmo feliz?  Alguém disse, ‘Quando você satisfaz um desejo você se torna feliz. A A felicidade está entre a satisfação de um desejo e o despertar de outro desejo. Mas isso não é verdade.  Não há garantias de que o indivíduo ficará feliz depois de ter um desejo realizado. Talvez a pessoa tenha querido muito um novo trabalho; e quando o consegue, se dá conta de que não era bem tão bom assim. Portanto, não existem garantias de que a cada vez que você tem um desejo satisfeito, você ficará feliz.  Além do mais, não existe uma regra de que você só pode ser feliz após realizar um desejo.

Uma vez eu vi um cartaz em Mumbai promovendo a bateria de carro “Standard Battery”. No cartaz tinha uma pergunta: ‘Qual a semelhança entre uma sogra e a “Standard Battery”?’ A resposta vinha abaixo: ‘É que ambas não param nunca!' (Risos). Diga-me quais desejos você satisfez? Você expulsou seu inquilino quando decidiu que queria seu apartamento de volta? Você se livrou do posseiro que invadiu sua terra? Você pagou todas as suas dívidas do cartão de crédito? Você recuperou o dinheiro que você havia emprestado? A financeira devolveu o seu depósito? Você conseguiu recuperar todo o cabelo que você havia perdido de sua cabeça? Os políticos mudaram? Os padres das diferentes religiões se deram conta de suas responsabilidades? Quais desejos você realizou? Todos os desejos ainda estão aí. Alguns desses desejos não parecem que serão realizados nunca. Apesar disso, você pode descobrir momentos de felicidade. Isso significa apenas uma coisa: você não precisa realizar um desejo para ser feliz.


A Felicidade está centrada em si mesmo

Isso não é um fato ordinário. Você não precisa mudar nada. No entanto, você consegue descobrir um momento de felicidade sem ter realizado um único desejo. Com frequência você descobre que os momentos de alegria em sua vida ocorrem quando você não satisfaz nenhum desejo. Por um instante sua atenção é tomada por uma situação que o distancia das noções que você tem de si mesmo. A insatisfação que você sente por si se desfaz naquele momento e então você se descobre feliz.

A felicidade não está nem dentro de você nem fora de você. O mundo exterior não lhe pode negar a felicidade, nem pode criá-la para você. O mundo pode apenas prover situações nas quais você possa ser feliz. E muito menos sua mente pode criar felicidade para você; no entanto, você às vezes se descobre feliz. Quando você vê uma flor, você se relaciona com ela como um objeto. Você diz ‘Isso é uma flor’, da mesma forma que você diz ‘Isso é um Swami’, ‘Isso é uma cadeira’, ‘Isso é uma árvore’, e assim por diante. No entanto, você não pode apontar para algo e dizer ‘Isso é felicidade’. A forma com que você se relaciona com a felicidade é ‘eu sou feliz’, ‘eu não sou feliz’. Isso significa que o fato de você ser ou não feliz é centrado na noção que você tem do eu. Por isso não tem sentido você dizer que você não é um sucesso. Se você pensa que o sucesso depende da realização de seus desejos, então, de fato, você não é um sucesso.

Como um professor, meu trabalho aqui é o de apenas chamar sua atenção de volta para si mesmo. Se mesmo sem satisfazer qualquer de seus desejos, você consegue ser feliz e você consegue se aceitar, então você está bem. Você terá uma jornada bastante edificante adiante. Isso é o que significa a palavra ‘mokṣa’ em Sânscrito: liberdade; ou seja, liberdade da noção de quem você pensa que seja. Tecnicamente nós dizemos saṃsāritva-nivṛtti, que é liberdade da noção equivocada sobre a sua natureza de ser limitado e infeliz. Essa felicidade não é apenas uma esperança, mas um entendimento que vai além da esperança. Sua própria experiência de felicidade lhe dá um maior entendimento sobre si mesmo, e isso não é apenas uma questão de esperança.


As noções que temos sobre nós mesmos não nos são intrínsecas

Quando você vê o sol encoberto por nuvens, você não conclui que o sol não existe. O próprio fato de você ver as nuvens revela que o sol existe. A borda prateada que delineia a nuvem sugere a existência do sol. Você verá o sol, não importa quão nublado o céu esteja, já que o céu não é estático e está sempre se movendo. Enquanto um grupo de nuvens se afasta e outro grupo de nuvens se aproxima, você consegue ver o sol ali, naquele pequeno espaço entre as nuvens.

Da mesma forma, apesar de todos seus problemas, frustrações, insucessos e todo o seu julgamento sobre si de que não é uma boa pessoa, você ainda consegue vivenciar a felicidade. Isso acontece porque todas as noções sobre o eu são variáveis e não intrínsecas ao próprio eu. Essas noções são apenas pensamentos passageiros, uma vez que eles não têm um fundamento, uma base sólida.  Como são variáveis, esses pensamentos se vão e você consegue se reconhecer como uma pessoa capaz de ser feliz. Uma pessoa feliz é uma pessoa que não tem medo do mundo e está livre da sensação de insegurança.

Quando você se esquece de si mesmo, você se descobre como um ser feliz. Imagine eu lhe fazer esta pergunta ‘Quando você quer ser feliz?’ Você não vai me responder ‘Ah, eu quero ser feliz somente amanhã, porque hoje eu estou curtindo uma fossa’. Talvez, no intuito de barganhar, você diga ‘Swamiji, eu estou preparado para ser infeliz hoje, mas por favor dê um jeito para, ao menos, eu ficar feliz amanhã!’ Então, onde está seu desejo? Está na infelicidade? Não, seu desejo está sempre na felicidade. Você quer ser feliz agora e sempre, em qualquer lugar, e em qualquer situação. Sendo assim, você terá de concluir que essa tal felicidade, que você experiencia em certos momentos, apesar de seus desejos não serem satisfeitos, deve ser mesmo verdadeira; e isso o faz ser totalmente aceitável. É assim que o indivíduo tem um entendimento sobre a questão da insegurança.

Seguranças materiais não resolvem o problema da insegurança. Dinheiro, poder, influência, nome, saúde e amigos criam um sentido de segurança. Não estou dizendo para você descartá-los; no entanto, saiba que conquanto você pense que tudo isso é necessário para que você possa se sentir seguro, então você é de fato inseguro.


Todo mundo quer se livrar das muletas

Ninguém quer se apegar a muletas.  Imagine que alguém fraturou a perna e tem de usar muletas por três meses. Até que um dia a pessoa se cura e pode voltar a caminhar sozinha sem a ajuda delas. O médico diz ‘Agora você já pode andar sozinho; você não precisa mais de muletas’. Mas a pessoa insiste, ‘Doutor, eu venho usando essas muletas já há três meses e agora eu não consigo viver sem elas. Eu quero usá-las para sempre.’ Ora, ninguém quer usar muletas para sempre! É da natureza humana querer ser livre.

Todo mundo quer caminhar com as próprias pernas, ser independente. Isso é o que chamamos “ficar em pé sobre seus próprios pés”. Você aprende isso já na infância. No começo, uma criança que está aprendendo a andar se agarra a alguma coisa ou a alguém. Mas depois, a medida que a criança cresce, ela aprende a encontrar seu próprio equilíbrio e consegue andar sozinha, sem nenhuma ajuda. O afã é sempre por liberdade, liberdade das muletas.  Da mesma forma, se o dinheiro lhe dá uma sensação de segurança, e você aceita isso; mas ao mesmo tempo isso também revela a sua insegurança.

Como indivíduo, você tem noção de suas inseguranças e se sente incompleto. Por isso, você busca segurança em algo ou alguém que o faça sentir-se completo. Você quer se sentir diferente do que você se sente; você quer ser reconhecido pelas outras pessoas e então sai em busca dessa aprovação. Porém, as outras pessoas também buscam o seu reconhecimento. Ambos buscam o mesmo reconhecimento, e ambos o conseguem, porém sempre de forma condicional.

Meu objetivo aqui é fazê-lo ver que você busca reconhecimento dos outros porque você mesmo não se aprova. Por isso que quando alguém lhe diz que você é uma pessoa maravilhosa, você pergunta, ‘Mas você acredita mesmo que eu seja essa pessoa maravilhosa? Por quê?’ Você pergunta isso porque você duvida disso! No fundo, você não se aprova verdadeiramente.

Que isso fique bem claro para você: o ser tem de ser totalmente aceitável para você. Mesmo que toda a humanidade diga que você não é uma boa pessoa, se você se vê como uma boa pessoa, então não há nenhuma indagação ou confusão.  Se toda a humanidade começasse a dizer que você na verdade não é um ser humano, você começaria a duvidar disso? Você vai parar para verificar se você tem uma cauda? Mesmo que a humanidade toda seja louca de lhe dizer uma coisa dessas, você vai ficar tranquilo e apenas constatar que isso não é verdade, e que a humanidade enlouqueceu. Isso é conhecimento. Você não vai comprar a ideia dos outros. O que os outros pensam não significa nada para você, conquanto você pense adequadamente sobre si próprio.


O problema é você e a solução é você

Na visão do śāstra, o ser sempre é completamente adequado. Você percebe isso quando experiência um momento de pura alegria. Nesse momento de alegria fica claro que você já é seguro, que você já é feliz. O mundo não mudou. As estrelas, o sol, o planeta, as pessoas, tudo continua o mesmo. Nada mudou e, no entanto, você consegue se alegrar com si mesmo com leveza. A razão disso é que você se percebe diferente quando você está feliz. Na verdade, você se percebe como a pessoa que você sempre quis ser.  O que você queria ser, você já é. É por isso que eu digo: você é o problema e você é a solução.

Se isso é verdade, então a liberdade dessa não aceitação e confusão sobre si mesmo é que chamamos de mokṣa. O que é completamente diferente do que ir para o svarga, o céu. A maior parte das religiões age como agentes de turismo para o céu.  Porém, nós encaramos esse ‘céu’ apenas como umas férias temporárias, uma escapada dos problemas. Se não existe aprovação de si mesmo, a pessoa pode se sentir infeliz mesmo no céu. Ir para o céu não é mokṣa. Mokṣa é aqui e agora. Temos de entender essa verdade.

Uma coisa é certa: o seu problema não é outro além de você mesmo. Por isso ninguém virá salvá-lo. Você é o seu próprio salvador. Aliás, você nem precisa ser salvo. Você já está salvo porque você não pode ser mais do que você já é.

A ciência moderna tem provado que tudo é uma manifestação. Quando você olha para o céu, você vê as estrelas brilhando muito longe. A luz dessas estrelas leva milhares de anos para atingir a Terra. Através do telescópio Hubble, você pode até ver as estrelas cujas luzes começaram a brilhar há doze milhões de anos. E no entanto, existem pessoas que dizem que o mundo foi criado há dois mil anos. Uma vez na Califórnia, uma pessoa que até teve uma educação escolar discutiu comigo sobre isso. Foi um episódio interessante. Ele argumentava que o mundo havia sido criado há três mil anos. Eu respondi. ‘ Como pode dizer uma coisa dessas? E todos esses esqueletos de dinossauros cuja existência foi provada e datada pelo método do Carbono 14 como tendo milhões de anos?’ Ele me respondeu, ‘ Nós não aceitamos o teste de Carbono 14.’ Eu lhe disse, ‘ Mas quem é você para aceitar ou não o teste de Carbono 14? Esse teste é comprovado pela Ciência.’ Então ele me perguntou, ‘ Você aceita o fato de que Deus é todo poderoso?’ Eu disse, ‘Sim.’  Então ele me disse com um sorriso triunfal, ‘ Se Deus é todo poderoso, não seria possível ele ter colocado alguns esqueletos de dinossauro quando ele criou o mundo há três mil anos?’ Então eu perguntei a ele educadamente, ‘ O senhor vai querer o seu café com ou sem leite?’ Eu me dei conta de que era inútil continuar a conversar com ele!

Como alguém pode dizer que o mundo foi criado há três mil anos?! Se mesmo com todas as evidências da ciência, uma pessoa insiste em uma crença que é comprovadamente errada, então temos de ter mais é pena de tal pessoa. Ela tem um problema psicológico. A ciência já provou além de qualquer dúvida que o mundo não é uma criação; é mais uma manifestação. Tudo que existe aqui não são nada mais do que objetos quânticos; tudo são partículas quânticas.

Se tudo o que existe, incluindo um elétron, é um objeto quântico, então quem é essa pessoa que é consciente até de um elétron? Essa pessoa é vista em nosso śāstra como a pessoa que é o conteúdo de tudo, e que é a resposta para o que chamamos de condição humana.

A condição humana é caracterizada pelo fato de sermos autoconscientes. Se não existisse a consciência de nós mesmos, não existiria o julgamento de si mesmo, nenhum complexo, nenhum problema existencial, nenhum problema de qualquer tipo, a não ser o problema da sobrevivência que todos os seres vivos têm.  Mas existe uma autocrítica, na qual o ser tem de ter uma aprovação, senão o ser não vai se sentir aceito ou aprovado como pessoa. Tal sentido de autoaprovação é experienciado pelo ser humano, mas não é reconhecido.  O ser somente se sente aceito e aprovado quando experiencia momentos de plenitude, quando se está feliz com o mundo, consigo, com tudo ao redor. Você próprio é a solução final; e não pode aceitar nada menos do que isso. Então, mokṣa não é uma quimera. É liberdade das noções equivocadas sobre si mesmo. A isso chamamos espiritualidade.



O que é uma vida espiritual?

Uma vida religiosa não é uma vida espiritual, mesmo que cada pessoa espiritualizada leve uma vida religiosa. Uma pessoa espiritualizada não pode ter uma vida espiritual sem ser religiosa. Ser religiosa não significa apenas religiosidade. Ser religiosa é ter a compreensão de īśvara. Você se reporta sempre à īśvara. As pessoas que têm um sistema de crenças e o usam apenas com o intuito de irem para o céu não precisam de nenhuma mudança. Tudo de que necessitam é viverem com suas crenças e depois morrerem com elas. Essa é uma vida religiosa.

Na Índia, os aspectos religiosos, culturais e sociais são fortemente interligados. Acontece que tudo está ligado à vida religiosa; mas temos de compreender isso profundamente. Nós temos várias imagens, várias formas, mas não sabemos bem sobre seus conteúdos. A espiritualidade nos ajuda a ver o espírito que está por trás da imagem. Uma vida espiritual significa reconhecer que você é a solução. Você tem de saber que você é a verdade por trás de tudo. Se esse é o objetivo, então sua vida se torna de fato espiritual. Isso é chamado vyavasāyātmikā buddhiḥ, a clareza de objetivo, entendendo que o que buscamos nada mais é do que a libertação de nossas inseguranças. Libertação das inseguranças é a própria segurança, e é isso que você é. Nosso śāstra diz que não existe nada mais seguro do que você. Tudo o mais tem sua existência em você. Isso sim é que é uma visão! Você é a segurança máxima. Saber que fundamentalmente você não tem nenhum problema é um desafio para você. Você me diz, ‘ Swamiji, eu quero ser salvo, eu quero ser salvo!’. Mas você já está salvo!

Mirabai fala assim em uma de suas canções: ‘Eu fui procurar o guru. Eu o saudei e pedi a ele que me salvasse. Sabe o que ele fez? Ele virou os meus olhos para dentro de mim. Fui procurar meu guru para ser salvo e cruzar esse oceano da existência. E para minha surpresa, descobri que não tinha nenhuma água sob meus pés.’ Que canção maravilhosa! Nós temos essa visão; e está em toda a parte. Em nossas canções, cultura, idiomas, seja em Tamil, Hindi, Telugu, Gujarati, Assamese ou qualquer outra, essa visão é muito presente.


Você é um sucesso quando o objetivo último está claro para você

O objetivo último deve ser muito claro para você. Quando você identificar o objetivo, lhe asseguro, você terá êxito. Não há nenhuma razão para você concluir que você não terá êxito porque você está na finitude da vida. É uma questão de se apropriar disso; é um processo de aprendizado e de ganhar clareza dessa visão. Esse entendimento por si só é incrível!

Você irá entender isso melhor com esse incidente que se passa em uma vila. Um Subramaniam, chamado Subbu, herdou bastante dinheiro. Ele não estava trabalhando e nem tinha vontade de trabalhar. Ele passava o tempo de forma ociosa, mascando folhas de bétula. Ele vivia apenas para comer. Era impossível cozinhar para ele. Ele costumava se irritar e atirar o prato longe se o sal da comida estava um pouco a mais ou um pouco a menos para seu gosto. Já que ele vivia para comer, comer se tornava o único projeto de vida dele. Pela manhã ele falava sobre o menu do almoço; no almoço, ele falava sobre o menu do jantar, e no jantar ele falava sobre o menu do café da manhã do dia seguinte. Nenhum cozinheiro o satisfazia. Ele estava sempre com raiva. Então, um dia, a vizinha dele me pediu que eu fizesse alguma coisa. Fui falar com Subbu e descobri que ele cantava muito bem e que tinha uma bela voz. Eu disse a ele, ‘ Você tem uma voz muito boa. Você tem talento.’
‘Verdade, verdade mesmo, Swamiji?’
‘Sim, você tem uma bela voz e talento para a música.’
‘Você pensa que eu posso aprender música, Swamiji?’
‘Sim, você deve aprender música. Aproveite que tem um professor de música aqui perto’.

Então Subbu começou a aprender música e pouco a pouco a música foi tomando conta dele. E como ele adorava música, depois de alguns meses, ele estava cantando o tempo todo, enquanto comia, enquanto caminhava; enfim, enquanto fazia qualquer coisa. Alguém cozinhar para ele já não era mais um problema. Ele se deu conta de que a música era um prazer estético muito mais profundo do que comer. Isso é mudança!


A visão do śāstra muda nossas prioridades

É por isso que temos de passar, por uma transformação, por uma mudança. A mudança não é dos papéis sociais que a pessoa tem como policial, ou marido, ou esposa, ou pai, mãe, sogra, nora; a mudança é você, a pessoa fundamental que está vivendo cada um desses papéis. Quando você muda toda a sua atitude com relação a si mesmo, então você tem sucesso.

Tal mudança é como aquele imenso painel no saguão do aeroporto de Londres. É muito interessante observá-lo. No painel têm os nomes de várias companhias aéreas como Air India, British Airways, Air Canada, Air France, KLM, e tantas outras. No início a Air India nem aparecia na lista do painel. Dali a pouco, ela começou a aparecer no fim da lista com o horário do embarque. Quando a informação no painel tem de mudar, se ouve um som tipo ‘gada, gada, gada, gada’ que chama a nossa atenção. Se não fosse isso, a pessoa acabaria dormindo enquanto esperava a conexão e acabaria perdendo o vôo. Então você ouve o ‘gada, gada, gada, gada’, e nota que a Air India que estava lá no final sobe um nível porque a British Airways que estava lá no topo decolou. Dali a um tempo, de novo você ouve ‘gada, gada, gada, gada’. Agora é a Air Canada que está no topo. Então você também nota que a Air India que subiu mais alguns níveis rumo ao topo está pronta para o embarque. ‘Gada, gada, gada, gada’  e a Air India finalmente decola. Dessa mesma forma, um ‘gada, gada, gada, gada’ tem de se desenrolar em sua mente também. Prioridades têm de mudar; uma mudança acontece para que decolemos.

Você não precisa mudar nada. Você não precisa mudar de emprego; você não precisa ir para um ashram; você não precisa ir a lugar nenhum. Você muda apenas estando no lugar em que está. As prioridades é que mudam para uma decolagem. Essa é uma vida de sucesso. Nosso śāstra lhe dá essa visão, lhe dá esperança. Não apenas esperança, mas aponta para essa sua experiência e revela o que ela significa. O que mais você precisa? Você não precisa de mais nada. Nenhuma garantia é requerida.

Portanto, quando essa mudança acontece em sua mente, você dá prioridade ao seu objetivo. Então, tudo o mais se torna secundário a esse objetivo. Não tem como errar. Isso é maravilhoso! Você consegue realizar várias coisas em sua vida. Falando de forma relativa, você também consegue atingir o sucesso. Porém, fundamentalmente, você deve ser capaz de ver que você mesmo já é a solução.

Não há nada melhor do que descobrir quem somos de verdade. Quando você está feliz, você é a plenitude. E essa completude que você experiência é a felicidade. Essa completude é a sua verdadeira natureza. Você precisa saber disso. É por isso que quando estamos felizes, estamos relaxados, nos sentimos em casa. A gente não reclama assim: “Ai, esses dias ando tão feliz; eu não sei por que ando tão feliz’. É o seu estado natural ser essa pessoa plena!