quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Satasanga com Swami Dayananda - Inadequação






Pujya Swamiji, com alunos do segundo curso de Vedanta, em Rishikesh, nos anos 70





Pergunta: Qual é o seu conceito de moksha?

Swamiji: O meu conceito de moksha é liberação do sentido de limitação e da sensação de dependência de felicidade e de segurança. Esse conceito não é meu, é o conceito de Vedanta.


Pergunta: Isso significa liberação do materialismo?

Swamiji:  Liberação da sensação de inadequação.


Pergunta: A inadequação pode ser especificada. A minha inadequação pode ser o fato que eu não tenha uma alta posição social. Para algumas pessoas, pode ser o fato de não terem dinheiro suficiente. Uma pessoa pode dizer que precisa de um tanto, e eu posso dizer que preciso de um pouco mais.

Swamiji:  É tudo a mesma coisa. Você está falando do seu conceito de adequação, você está aceitando a inadequação de qualquer jeito. Você pode achar que tendo mais dinheiro você se sentiria adequado. Um outro pode achar que se tivesse mais poder ele se sentiria adequado, e outro se tivesse fama. Uma outra pessoa poderia desejar um título, posição, ou qualquer outra coisa, mas no fundo todos tem um sentido de inadequação.


Pergunta: O problema da inadequação precisa de...metafísica…alma…meditação?

Swamiji: Podemos admitir o seguinte: que existe uma autoconsciência, e consequentemente autojulgamento. O julgamento universal é “eu sou inadequado”. E quando eu me considero inadequado, eu não suporto isso e portanto existe uma pressão natural para que eu me torne adequado. De acordo com o seu conceito de inadequação, existe algo que faria com que você se sentisse adequado, e essa coisa varia de pessoa para pessoa. Evidentemente, seria impossível para você se sentir adequado, uma vez que a inadequação mais alguma outra coisa, ainda seria inadequação.  
Quando você avalia um ganho, levando em conta a perda envolvida, esse ganho não será tão grande assim, uma vez que em todo ganho existe uma perda. Todo ganho é seguido de uma perda. Você consegue algo somente quando você investe algo, e dessa forma você descobre que, no mundo relativo, todo ganho envolve algum nível de perda. Sendo assim, obviamente, a inadequação continua existindo e essa é a experiência de todos, sem exceção.

A questão que surge então é se a necessidade de ser adequado é uma coisa natural ou não. É um desejo, uma necessidade natural, e ninguém consegue controlar isso, mesmo porque ninguém se ‘torna’ adequado. Eu não posso parar de lutar contra a inadequação, e, portanto, eu preciso achar uma solução. E se essa solução não está disponível empiricamente, eu vou chegar necessariamente à questão: “Serei eu realmente inadequado? A inadequação é meramente um ponto de vista”?

Suponhamos que a inadequação em si seja apenas um julgamento baseado em um ponto de vista e eu o esteja considerando absoluto. Suponhamos que o ponto de vista faça com que eu seja inadequado, me veja como inadequado, então isso é um problema somente meu; se uma outra coisa é inadequada, isso não é problema meu, não é um problema focado no “eu”.  Assim, se existir uma inadequação focada no “eu” - eu sou inadequado.  Portanto, eu tenho que descobrir a mim mesmo como ‘adequado’.

Não existe uma maneira de eu descobrir adequação por mim mesmo através de riquezas, poder ou qualquer outra coisa, porque qualquer ganho será inadequado, e, portanto, “eu” mais alguma coisa ainda será inadequado. Inadequado mais inadequado é igual a inadequado. Finito mais finito é finito do mesmo jeito. Portanto, através da inadequação não tenho nenhuma possibilidade de atingir a adequação para mim mesmo. A minha necessidade é natural, e eu não aguento mais ser inadequado; a sensação de inadequação é algo com o qual eu não consigo viver bem. Assim sendo, talvez eu deva descobrir que eu não preciso “me tornar” adequado. Tornar-se adequado não faz sentido. Talvez eu já seja adequado. Basta dizer esse ‘talvez’. Talvez eu seja adequado.
Portanto, a questão toda está de novo com você mesmo. Então você pode perguntar: ‘quem sou eu’? E então a questão se torna metafísica.



Pergunta: Será que a estrutura social como um todo é de uma forma tal onde todos se sintam inadequados?

Swamiji:  A questão de se sentir inadequado é um problema individual. Afinal, quando você se acha inadequado ou a sociedade está projetando inadequação em você, é inadequação de qualquer jeito. O que eu estou querendo dizer é que mesmo que não existisse a sociedade, o sentido de inadequação ainda existiria.
Eu gostaria de saber como é que você se vê, o que é o ser? Suponhamos que você diga que você é o corpo físico, então decididamente você é inadequado. Se você disser que você é a mente, você decididamente é inadequado também. Se você disser: “Eu sou o conhecimento que eu acumulei”, decididamente você é inadequado, porque o conhecimento nunca chega a ser adequado. Assim, de qualquer forma que você olhe para si mesmo, haverá inadequação, esse é o julgamento básico. Primeiro você julga a você mesmo e depois olha para si mesmo através dos olhos da sociedade. Você olha para outra pessoa e se essa pessoa é admirada, ou considerada mais bonita, você logo cria um complexo. E se uma outra pessoa for mais bem-sucedida, você cria outro complexo.


Pergunta: Você está tentando dizer que existe ignorância de si mesmo?

Swamiji: Sim, eu nasci com ignorância e ela tem dois aspectos: um é a ignorância de mim e a outra é a ignorância de tudo o mais. Eu possuo meios de conhecimento, tais como percepção, inferência, etc. para conhecer as coisas além de mim, que não são eu. Mas a auto ignorância continua. Você não precisa de autoconhecimento para acionar os demais meios de conhecimento. Você pode ser um cientista famoso sem ter autoconhecimento, e nesse quesito não há distinção entre os seres humanos e os animais.


Om Tat Sat